Existe uma igreja fundada por Gilbert Crammer?

Ainda é corrente entre alguns membros e líderes da Igreja de Deus (7º Dia) no Brasil de que a igreja tem uma linhagem exclusiva, isto é, por fora do cristianismo convencional. Contudo, esta é uma ideia abandonada há muito tempo pelos principais pioneiros, que foram ferrenhos defensores deste pensamento. Esta ideia apregoava que a Igreja de Deus (7º Dia) tinha uma história que não perpassava pela história do protestantismo e que muito menos uma relação com a Igreja Adventista do Sétimo Dia. O que dá para pereceber nos comentários de muitos irmãos, atualmente, (talvez de uma geração mais recente, que teve pouco contado com as publicações da Igreja de Deus, seja a de fala inglesa ou espanhola, como os pioneiros tiveram que, por isso, desenvolveram uma ideia menos influenciada e mais pura sobre a aparente exclusividade da Igreja de Deus) é que eles confundem a fundação da Igreja do primeiro século com supostas “fundações” modernas, que nada mais são do que reorganizações necessárias da própria igreja primitiva depois de séculos de mutilações sofridas pelos poderes políticos e religiosos que dominaram o mundo ao longo da história cristã.

Eu sou de um tempo que a Igreja no Brasil já havia iniciado, mas ainda era muito jovem, 8 anos apenas (1982-1990). Não tínhamos material impresso (ainda temos muito pouco) e tudo o que conseguíamos aprender sobre a Igreja era de publicações americanas, como Bible Advocate, La Pura Verdad, Acts e God´s Watchmen. A primeira história da Igreja que li foi um longo conjunto de doze artigos publicados na revista La Pura Verdad, da antiga Igreja de Deus Mundial, ramificação de uma divisão da Igreja de Deus (7º Dia), liderada por Herbert Armstrong. Nós, membros novos, não sabíamos nada sobre as divisões da Igreja nos Estados Unidos e tínhamos que todas estas revistas eram da mesma organização, por isso, recebíamos estas histórias com imensa alegria (até hoje, elas são importantes para motivar nossa fé).

As divisões começaram a ficar mais patentes a partir da divisão de 1995 aqui no Brasil. Estas revelações de divisão nos EUA serviram para explicar a divisão que acabara de ocorrer aqui no Brasil. O conhecimento de que nos Estados Unidos haviam vários segmentos da Igreja de Deus veio meio como um balde de água fria para o novos conversos da época que criam nesta história de uma igreja verdadeira. A ideia de uma “igreja que não puderam destruir” sofreu mais erosão quando se soube que no México não era diferente. Para piorar a situação, as divisões mexicanas da Igreja serviram como mecanismo para classificar e desclassificar as facções brasileiras. Quem não estivesse ligado a determinada igreja no México não era de Deus. Esse foi um pensamento maldoso que reforçou os ânimos no Brasil e forçou o distanciamento entre os irmãos.

Foi graças a outra divisão, 2001, separando-se do corpo da antiga OGID (Organização das Igreja de Deus), dando origem ao segmento das igrejas autônomas com mais ou menos 30 congregações, que este distanciamento parou de progredir, principalmente, porque muitas destas congregações aderiram à nova OGID.

O encantamento com uma igreja verdadeira definida por uma linhagem permaneceu por muito tempo (ainda permanece) até que o advento da internet permitiu uma profusão de informações mais detalhadas da história da igreja, contada por aqueles que vivenciaram, ou alguns de seus antepassados, os fatos.

Não foi novidade para aqueles um pouco mais antigos na igreja, conversos da década de 90, de que havia uma relação da Igreja de Deus (7º Dia) com a Igreja Adventista. Parte desta história líamos nas antigas publicações, contudo, não ficava muito claro o teor desta relação. Sempre foi dito que Gilbert Crammer tinha sido o responsável pela organização da Igreja de Deus nos Estados Unidos, por causa de um decreto do governo que obrigava os corpos religiosos a se registrarem junto ao Estado. Os novos membros que se achegaram na Igreja consumiram esta história na boa fé.

Também, se encontravam nestas publicações que recebíamos (muito poucas e poucas pessoas tiveram o privilégio de conhecê-las) que Gibert Crammer, sendo da Igreja de Deus, havia resistido fortemente às investidas dos adventistas Ellen Gold White e seu esposo Tiago White sobre a membresia da Igreja de Deus, rechaçando suas visões entre outros pontos doutrinários. Uma história contada, não com todas as letras, dava a impressão que Gilbert Crammer nunca havia sido da Igreja Adventista (que, por certo aspecto é verdadeiro, pois ele nunca pertenceu à Igreja Adventista, mas apenas ao movimento milerita). O fato é que ele não era de uma Igreja de Deus organizada que diziam existir. Aqui está o “X” da questão: Crammer não era adventista em todos os termos organizacionais, mas também não era da Igreja de Deus.

E por que Crammer está na história da Igreja de Deus (7º Dia)? Porque, sendo um homem de arrojado espírito missionário, iniciou uma revista chamada Hope of Israel, a qual, ao se espalhar pelas regiões centro-norte dos Estados Unidos passou a chamar a atenção de sabatistas independentes. Mas, Crammer não conseguiu levar avante seu projeto e em 1863 tudo teria acabado se não fosse um grupo de irmãos da cidade de Marion do Estado de Iowa, que souberam da revista por um incidente histórico, ter assumido a publicação.

Muitos detalhes históricos devem ser acrescidos a esta breve explicação para compreendermos o verdadeiro papel de Crammer. Farei isso futuramente na medida do possível, se as necessidades exigirem. O certo é que Gilbert Crammer tem relação tanto com adventistas e com a Igreja de Deus (7º Dia), contudo, não chega ser o fundador da igreja, porque a congregação que ele organizou se chamava Igreja de Cristo. Muito menos foi fundador da única Igreja de Deus existente que conhecemos através da Bíblia.

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